PERGUNTA: Percebemos uma proliferação de
"códigos" de umbanda. Aos umbandistas, em sua maioria não muito
afeitos ao estudo, esses "tratados" parecem definitivos, complicados
e de difícil entendimento. Tanto isso é verdadeiro que proliferam os cursos
pagos para acesso aos mistérios, muitos formando "magos". Isso é
condizente com a mediunidade natural e inequívoca (Zélio de Moraes incorporou o
Caboclo das Sete Encruzilhadas aos 17 anos, sem nenhum curso), com a
simplicidade e a essência da umbanda, ou seja, realizar a caridade?
RAMATÍS: Desde
os idos da saudosa Atlântida, o acesso aos mistérios sagrados foi de natureza
seletiva. Impunha-se alta moralidade e índole psicológica afeita ao altruísmo
aos iniciantes, no sentido de preservarem os conhecimentos ocultos da aplicação
negativa no campo da magia.
Nos dias atuais, o conhecimento está plenamente democratizado,
e cada um elege para si aquilo que o atrai em afinidade.
No caso do canal mediúnico que irrompe de forma inequívoca e
natural, em que uma entidade de alta estirpe moral se apropria da aparelhagem psíquica do médium, ditando orientações de alto valor doutrinário,
inevitavelmente trata-se de espíritos que tiveram longa e árdua formação em
várias encarnações.
É preciso entender que um ritual nada mais é que um meio de
organização terrena para disciplinar os atos invocatórios de acesso aos planos
ocultos, ocorrendo as verdadeiras iniciações no templo interior de cada
criatura. Portanto requer amor e ações práticas de auxílio ao próximo, sem
interesses personalistas, desde épocas anteriores à atual encarnação. Ritual de
iniciação aplicado se o iniciando não tem outorga e cobertura espiritual é como
uma carta remetida para endereço inexistente: as energias invocadas e evocadas
pela força mental do médium iniciador não encontrarão imantação no objeto da
iniciação. Ocorre nos dias atuais um atavismo em muitos religiosos de antanho
que se encontram, dentro do movimento de umbanda, dispostos espiritualmente a criar
castas e séqüitos, como se fossem proprietários da verdade definitiva, sem
nenhum comprometimento com a preexistência espiritual dos rebanhos que pagam
para ser iniciados coletivamente. É mais uma apoteose ritualística externa
coletiva que se "acasala" no espúito acrisolado no escafandro
grosseiro, ofuscado pelos rituais metódicos, do que interiorização do cidadão
entre dimensões de vida diferentes.
A luz e a simplicidade da espiritualidade, a qual abarca todas
as religiões, pois em todas está, começam a despontar nas consciências muito
antes da atual encarnação. Para entenderdes a profundidade dessa assertiva,
será uma surpresa para vós dizer que, quanto mais simples e amoroso fordes,
mais espiritualizado sereis, numa relação direta de proporcionalidade, seja
qual for vossa religiosidade.
Vosso intelecto é constritivo e vos separa da totalidade
como espírito. Enquanto as consciências sacerdotais (e para ser sacerdote não é
preciso ser médium) estiverem retidas nas discussões intelectuais que
fortalecem a mente concreta, não conseguirão sentir as percepções elevadas das
verdades cósmicas.
A essência umbandista dispensa o apelo de ser ela uma religião
definitiva, cheia de dogmas e tratados estupendos, o que exigiria a capacidade
de sintonia mental do iniciador com seu eu superior (atma-budhi-manas),
sua fonte de sabedoria, intuição divina e iluminação interior.
O contrário seria uma tendência de tornar complexo o que é
simples, o que demonstraria um intelecto avantajado em conhecimento, mas de
pouca sabedoria espiritual, fadado a se fixar em códigos definitivos, qual
pássaro hipnotizado em explicar as penas das asas (cor, tessitura, quantidade,
composição, freqüências, átomos, moléculas), considerando que voar é
dispensável, sem graça, como se as asas fossem mero acessório, acompanhado de
enorme manual explicativo sem nenhuma serventia prática, pois o ato de voar do
espírito é intuitivo.
Para compreenderdes melhor, imaginai um cientista
descobrindo muitas verdades subjacentes relacionando o mundo físico aos orixás,
o que o levará a enfatizar fatores como eletromagnetismo, ondas fatoriais e
linhas de forças, criando complicados mapas carregados de simbolismo mágico,
mas permanecendo numa esfera oca, sem a essência da simplicidade que cria a
sabedoria quando associada ao conhecimento em auxílio ao próximo, permanecendo
totalmente alheio às realidades espirituais mais profundas. Há uma desconexão
espiritual que exclui, o que o impede de entrar nos reinos de inclusão dos
verdadeiros orixás: praticar a caridade desinteressada, simplesmente utilizando
o canal mediunidade, como aconteceu com o jovem médium que cedeu seu psiquismo
ao espírito missionário que comunicou a umbanda.
DO LIVRO: “A MISSÃO
DA UMBANDA” RAMATÍS/NORBERTO PEIXOTO – EDITORA DO
CONHECIMENTO.
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