PERGUNTA: Como o fetichismo das crenças mágicas
populares juntamente com o sincretismo, fez "exu" ser associado ao diabo,
numa distorcida adoração ao demônio, como rito institucionalizado?
RAMATÍS: A nação africana que mais
influenciou a formação das seitas afro-brasileiras com seu fetichismo e suas
crenças mágicas foi Iorubá. Os escravos
africanos, ao contrário dos índios, que não foram escravizados, idealizaram o sincretismo
para poder realizar seus cultos nas senzalas. Inteligentemente, os orixás são
santificados, correlacionados com os santos católicos mais conhecidos. [1] Após
a alforria, essa situação se fortaleceu como forma de integração e legitimação
numa sociedade regida pelo catolicismo.
[1] Nota do médium - Na época da escravatura, os negros
eram obrigados a seguir o catolicismo. Quando batizados, recebiam um nome
português e tinham de freqüentar as missas aos domingos. Os sacerdotes iorubás,
entre outras nações africanas que passaram a viver no Brasil, imediatamente
identificavam cada santo com alguma das personagens que ilustravam os orixás,
aceitando esses santos prontamente, por sua índole espiritual mística e
universalista. Posteriormente, o sincretismo teve a propriedade de favorecer a
inclusão social da umbanda num momento de perseguição e preconceito. As
primeiras tendas e os primeiros terreiros levavam nomes católicos com a
finalidade de obter aceitação urbana. Ao contrário do início do processo sincrético,
em que os negros "fingiam" adorar os santos católicos para não sofrer
duras penas dos senhores, essa fusão de diferentes
cultos ou doutrinas religiosas, após a libertação dos escravos, sofreu uma
reinterpretação com o espiritismo, ocasião em que as fachadas das tendas e dos estatutos
de fundação tinham a denominação "espírita" associada a um santo
católico, para seus integrantes não serem perseguidos pela polícia. Durante a
escravidão, quando os negros construíam seus altares, eram obrigados a colocar
os santos católicos na parte superior, mas na parte inferior fixavam os
fundamentos dos orixás (pedras, minerais, oferendas votiyas, ervas, entre
outros símbolos) no chão de terra batida. Na hora de cultuar os santos, na
verdade cultuavam os orixás e assim conseguiam realizar seus transes
ritualísticos sem que o homem branco, o senhor ou o clérigo da vizinhança, os
proibissem. Pode-se afirmar que até hoje os pretos velhos são matreiros para
levar os consulentes a se modificarem e a fazerem aquilo que eles recomendam,
bem como se mostram atilados quanto ao famoso engambelo, quando o que parece
ser não é, principalmente quanto a processos obsessivos que envolvem entidades mistificadoras
querendo se mostrar aos médiuns como espíritos do movimento de umbanda e não o
são. É importante relembrar que nas raízes da fusão sincrética entre os orixás
e os santos católicos está um hábito que até hoje é adotado nos templos de umbanda:
chegar a um terreiro, saudar a entrada e depois o congá.
RAMATÍS: Tendo em vista a dualidade da
escolástica católica (Deus e diabo), os orixás, tendo sido santificados,
inevitavelmente faltava encontrar a figura representativa do diabo. É assim que
se instala nas populações periféricas, pobres, incultas e assustadiças,
constantemente ameaçadas de serem jogadas nos caldeirões fumegantes do inferno,
a demonização "exu", que se alastra rapidamente com o apelo mágico
que o envolve. No contexto cultural brasileiro, hegemonicamente católico, esse
conceito de "exu" é o que mais influenciou o imaginário popular e
passou por distorções em conseqüência da amplitude do processo de inclusão social
dos cultos que saíram do interior das senzalas e ganharam as ruas e os morros,
sendo transfigurado no diabo pelo candente sincretismo.
Para entenderdes a origem ancestral da questão, importa dizer que para os povos iorubás, e de certa forma até os dias atuais, nos clãs tribais, em que os homens são livres para ter muitas mulheres, quanto mais filhos tiverem, melhor. O sexo significa procriação, progresso, sendo cultuado o "exu" Elegbá ou Elegbara, que simboliza a fertilidade, entre um conjunto de divindades de sua religiosidade politeísta, todas reverenciadas com valor evocativo, mágico ou místico.
Assim, num meio social em que o sexo e suas conotações eram fortemente reprimidos e associados ao pecado, o lado fértil desse "exu" foi muito dissimulado. A imagem forjada pela conservadora sociedade católica, ao contrário da liberalidade desprovida de culpa, autoflagelação e penas eternas dos iorubás, extirpou o esplendor reprodutivo do explícito Elegbá ou Elegbara, tradicional no panteão africanista, distorcendo ao máximo os símbolos de fertilidade, bem como o foi Príapo, deus greco-romano igualmente classificado como herético pela Inquisição.
Para entenderdes a origem ancestral da questão, importa dizer que para os povos iorubás, e de certa forma até os dias atuais, nos clãs tribais, em que os homens são livres para ter muitas mulheres, quanto mais filhos tiverem, melhor. O sexo significa procriação, progresso, sendo cultuado o "exu" Elegbá ou Elegbara, que simboliza a fertilidade, entre um conjunto de divindades de sua religiosidade politeísta, todas reverenciadas com valor evocativo, mágico ou místico.
Assim, num meio social em que o sexo e suas conotações eram fortemente reprimidos e associados ao pecado, o lado fértil desse "exu" foi muito dissimulado. A imagem forjada pela conservadora sociedade católica, ao contrário da liberalidade desprovida de culpa, autoflagelação e penas eternas dos iorubás, extirpou o esplendor reprodutivo do explícito Elegbá ou Elegbara, tradicional no panteão africanista, distorcendo ao máximo os símbolos de fertilidade, bem como o foi Príapo, deus greco-romano igualmente classificado como herético pela Inquisição.
Com o avanço das concepções
judaico-cristãs-católicas sobre as antigas religiões dos orixás ligadas às
nações africanas, ao qual se juntou o espiritismo kardecista no final do século
XIX, esse "exu" foi empurrado cada vez mais para o lado do mal. Esse
fato se intensificou com os seguidores sincréticos da umbanda e persiste
potencializado e distorcido em muitos terreiros "umbandistas" e centros
espíritas, por intermédio de suas lideranças, que não estão muito preocupadas
com a verdadeira orientação crística e universalista de seus adeptos. Mesmo
"exu" tendo sido transformado em diabo, é um diabo dos católicos, com
a seguinte falsa imagem: ganhou chifres, rabo, pés de bode, labaredas infernais,
capa, tridentes e outros adereços dos demônios antigos e medievais,
arquitetados pelo catolicismo inquisitorial para combater as seitas pagãs. Essa
aparência assustadora foi inspirada por videntes influenciados pelas entidades
"infernais" do Astral inferior, que se locupletam nos gozos terrenos
imantados a seus dóceis aparelhos fascinados que enxameiam na crosta,
ocasionando a invasão dos congás por imagens diabólicas, facilmente encontradas
em qualquer esquina citadina, em suas floras comerciais e lojas de quinquilharias
mágicas. O Astral inferior, alter ego da maioria dos homens, exultante,
conseguiu dar um perfil psicológico de gozador, beberrão, violento e destemido
e atribuiu palavras chulas e de baixo calão aos prestimosos exus, introduzindo
o falso, o engambelo no trabalho verdadeiro dessas entidades luminares da
Divina Luz, da umbanda.
Tristemente, associaram-no a locais dissolutos; seus sítios vibracionais tornaram-se as encruzilhadas das ruas e seu habitat no Astral transfigurou-se em becos de prostituição, entre vapores etílicos, baforadas de cigarrilhas fétidas, garrafas de cachaça quebradas e mulheres seminuas que vendem o corpo pelo vil metal.. Na verdade, esses cenários são os que nutrem os canecos e as piteiras vivas do além-túmulo, que dominam muitos terreiros ditos de "umbanda", na Terra, mas que aos olhos do Espaço servem de ponte para o parasitismo alimentado pelo que há de mais inferior que se agasalha nos egos inflados das frágeis criaturas humanas: a satisfação dos desejos, doa a quem doer.
Tristemente, associaram-no a locais dissolutos; seus sítios vibracionais tornaram-se as encruzilhadas das ruas e seu habitat no Astral transfigurou-se em becos de prostituição, entre vapores etílicos, baforadas de cigarrilhas fétidas, garrafas de cachaça quebradas e mulheres seminuas que vendem o corpo pelo vil metal.. Na verdade, esses cenários são os que nutrem os canecos e as piteiras vivas do além-túmulo, que dominam muitos terreiros ditos de "umbanda", na Terra, mas que aos olhos do Espaço servem de ponte para o parasitismo alimentado pelo que há de mais inferior que se agasalha nos egos inflados das frágeis criaturas humanas: a satisfação dos desejos, doa a quem doer.
Do livro: “A Missão
Da Umbanda” Ramatís/Norberto Peixoto – Editora do Conhecimento.
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