...Marilda
e Sônia desceram à carne para cumprir uma prova de desventuras esquematizadas
pelas imprudências de outrora. Sem dúvida, a Lei Cármica marcou-as com a orfandade,
sem o direito do lar amigo, que já haviam conspurcado ou desprezado antes.
Planificaram
a atual existência conforme linhas de forças espirituais geradas carmicamente, que
não lhes davam o direito ao berço quente e amigo. Graças aos sentimentos
generosos de criaturas bondosas, elas foram ternamente acolhidas na 'Casa Madalena"
e passaram a usufruir de conforto, prazeres e estima ou favores, a que ainda
não tinham direito. Todavia, a Lei Espiritual, que não é punitiva, porém
educativa, aguardou a regeneração de ambas nessa oportunidade e só voltou a
agir, quando verificou que elas, incautas, continuaram a repetir os erros
passados, cedendo novamente aos impulsos animais inferiores. Almas primárias, reagiram
iradas e insatisfeitas contra a primeira advertência justa e disciplina
corretiva.
Embora
materialmente amparadas não estavam suficientemente esclarecidas para enfrentar
as dificuldades e os
sofrimentos próprios da vida cotidiana e
foram atraídas para a prostituição, pelas tendências
ancestrais pregressas. Lavínia mostrou-se inquieta e nervosa, interpelando o
guia:
— Porventura,
irmão Abelardo, ainda fomos insuficientes a essas órfãs?
— Em
verdade, não faltou amor nem proteção às jovens frustradas, porém, esclarecimento
de modo a superar as ciladas da vida profana. — Insistiu Abelardo cordialmente.
— Não se pode culpar os integrantes da "Casa Madalena" por essa
omissão involuntária, quando os seus servidores mal conseguem atender às
necessidades materiais das internas.
E
Abelardo completou, num sorriso fraterno:
— Aliás,
isso já aconteceu a todos nós!
— Não
compreendo! — redarguiu Lavínia, algo confusa.
— Criaturas
como Sônia e Marilda, ainda não conseguem dominar 'os desejos, as tentações e
dificuldades da vida humana, enquanto não forem convenientemente educadas espiritualmente.
Até as almas de melhor padrão espiritual, por vezes fracassam no intercâmbio
com as paixões humanas. Espíritos primários,
reagem voluntariamente ante a primeira
contrariedade, magoam-se pela diferença de tratamento alheio e revoltam-se
quando lhes impedem a realização imediata dos seus desejos.
— Mas
isso é suficiente para justificar-lhes a prostituição? — insistiu Lavínia, inconformada.
— Cinjo-me
apenas aos fatos já ocorridos, sem examinar sentimentos ou tecer críticas à
vossa boa intenção. Embora a ternura, o devotamento e a renúncia sejam virtudes
que vos glorificam perante Deus, nem por isso elas modificam a aplicação
correta e educativa da Lei do Carma sobre os espíritos falidos. Examinamos
"friamente" a vida agradável e sem obrigação onerosa de Marilda e
Sônia transcorrida na "Casa Madalena" até os dezessete anos de idade,
em comparação com os contrastes que ambas defrontaram no trabalho penoso de
mulheres casadas com homens pobres.
Na
"Casa Madalena" elas andavam sobre assoalhos de "parquete"
encerado, repousavam em poltronas fofas e aveludadas, dormiam em colchões de
molas, macios e confortáveis, guarnecidos de lençóis alvíssimos e cálidos
acolchoados. Viviam despreocupadas e alegres, assistindo filmes cinematográficos
e programas de televisão. Aos domingos excursionavam às praias e outros lugares
pitorescos. Durante o Inverno eram protegidas pelos aquecedores e no Verão
dormiam tranquilamente em aposentos amplos e de boa ventilação. Em suas dores e
incômodos, sempre tiveram assistência médica carinhosa.
Cumpriam
as tarefas escolares entre jardins floridos e alimentavam-se fartamente,
acrescidas de gostosas sobremesas. Durante o Natal e a Páscoa, os espíritas
ofereciam-lhes presentes e bombons de chocolate, ou então festejavam-lhes os
aniversários em comemorações joviais em torno dos simbólicos bolos de velas.
Infelizmente, devido ao seu
primarismo espiritual e cegas pelo egoísmo e amor-próprio, elas atingiram a
mocidade sem desenvolver a paciência, resignação, coragem e estoicismo, virtudes
necessárias às mulheres oneradas com a pobreza. Sem dúvida, julgando vingar-se
dos benfeitores, terminaram cavando a própria ruína na rebeldia contra a
disciplina e os estatutos da "Casa Madalena", e depois não puderam
superar os "contrastes violentos" e óbices imprevistos encontrados no
mundo.